quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

CAMPEONATO DE ORTOGRAFIA - 5ª FASE

O túnel até à escola
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O Rodrigo detestava ir para a escola a pé, embora a escola fosse mesmo ao lado de casa, porque havia sempre miúdos que o chateavam pelo caminho. Gozavam com ele, e o pior é que ele corava imenso, ficava com a cara toda encarnada e, por isso, ainda o gozavam mais.
- Olha, vem aí o semáforo encarnado – gritava um quando o via no passeio do outro lado da rua.
- `Bora lá fazê-lo passar a encarnado – dizia outro.
E, dois segundos depois, lá estavam eles à volta do Rodrigo. O Rodrigo dizia a si mesmo com muita força:
- Rodrigo, não cores, não cores, parvo!
Mas não era ele que mandava no sangue que lhe subia à cara e, uns minutos depois, estava encarnado como um tomate.
Nas aulas, os professores fingiam que não notavam quando o Rodrigo corava e não deixavam os outros fazerem troça dele, mas o caminho para a escola era um pesadelo.
O Rodrigo, todos os dias, tentava alguma coisa para não ir para a escola. Quer dizer, ele não tentava de propósito: era mesmo verdade que lhe doía a barriga, ou a cabeça, ou se sentia enjoado ou maldisposto. Pudera, o nosso corpo é muito inteligente e quando temos de fazer uma coisa que não queremos mesmo, mesmo, ele dá-nos uma ajuda. O estômago solidariza-se com o nosso coração e, pronto, ficamos com uns sintomas, quer dizer sinais, a que normalmente os nossos pais ligam mais do que quando nos queixamos de sentimentos como o medo ou a vergonha.
Mas a mãe do Rodrigo não tinha perdido a memória. Ela sabia muito bem que as doenças, às vezes, são sinais de que sentimos coisas que não queremos contar, às vezes nem sequer as percebemos suficientemente bem para as traduzir por palavras.
Por isso, insistiu e insistiu e ficou a saber que uns miúdos maus o chamavam semáforo encarnado. Queria ir à escola falar com a directora e com os pais desses meninos, mas o Rodrigo não queria, porque tinha medo de que depois ainda fosse pior.
Então o filho pediu-lhe um mês.
- Se daqui a um mês ainda estiverem a torturar-me, eu peço à mãe para ir à escola, pode ser? – pediu o Rodrigo que, claro, estava muito corado a dizer isto... porque, como se percebe desta história, as pessoas que coram, coram, e não têm culpa disso.
A mãe achou que o Rodrigo ia resolver o problema sozinho e ficou muito orgulhosa dele. Mas ele não tinha a menor intenção de ir lutar contra aqueles matulões do sexto ano.
A ideia era construir um túnel entre casa e a escola. E, nesse mesmo dia, começou a cavar, com ajuda de outros amigos lá do prédio.
E sabem que conseguiu mesmo? Um túnel escuro e estreitinho, mas que chegava mesmo até à escola. Assim, o Rodrigo ia para as aulas sem se cruzar com os idiotas. Mas, melhor ainda, todos os outros escavadores que o ajudaram a construir aquela passagem secreta passaram a ser os seus melhores amigos, na escola e fora dela, e o Rodrigo ficou tão contente que nunca mais teve dores de barriga de manhã. Ficou mesmo tão feliz, que até não se importava de voltar a encontrar aqueles parvos que o faziam corar, mas para quê, se tinha um túnel direitinho da cave ao recreio da escola, para além de não apanhar chuva no Inverno nem calor no Verão?
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Isabel Stilwell
Histórias para Contar em Minuto e Meio – 3

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